domingo, 21 de novembro de 2010

Intenção estética

Nesse ponto, capítulo 11, Huron generaliza e consolida todos os indícios experimentais do apredizado estatístico do ouvinte, suas expectativas harmônicas, tonais e rítmicas, no conceito de esquema. A idéia não é dele (a fonte é Gjerdingen, 1988, "Um volteio clássico da frase: música e psicologia da convenção") e pode ser descrita como um determinado conjunto percepetual que permite a cada ouvinte "reconhecer" e distinguir melodias e gêneros.

"Sem esquemas musicais, ouviríamos obras que se parecem mais ou menos, mas não haveria fronteiras, nem classes de obras. Expectativas específicas de cada peça emergiriam para peças individuais, mas os ouvintes experimentariam todas as músicas usando um único conjunto expectacional. Expectativas harmônicas, melódicas e rítmicas representariam "grandes médias" de toda a experiência musical de um ouvinte. (pág 217).

"A disposição do cérebro de encapsular o conhecimento em diferentes domínios torna possível para músicos diferenciar estilos e gêneros (notem que o sentido aqui é fisiológico, não cultural...). A importância musical de tal conhecimento encapsulado não deve ser subestimada. Para o historiador e o etnomusicólogo, a disposição do cérebro de segregar domínios específicos do conhecimento é certamente uma causa de alívio. Se esquemas de audição não existissem, um etnomusicólogo ocidental nunca seria capaz de experimentar música de outras culturas sem a intereferência constante dos hábitos de audição do Ocidente. Da mesma maneira, sem esquemas, historiadores não poderiam experimentar as hemiolas dos motetos latinos da Renascença sem serem impressionados por sua experiência com as síncopes audaciosas do jXXz moderno.." (pág 217).

O livro revela grande honestidade intelectual. O Huron, acho eu, queria criar um framework científico para analisar certas experiências mudernas com música (nomeadamente wagner, xonberg e Strawinsky) e mostrar qual a razão propriamente percepcional para as "novidades" que traziam. Conforme foi consolidando o material experimental e estatístico, uma coisa ficou óbvia: a estrutura da música ocidental é basicamente repetitiva, baseada em um número reduzidíssimo de mecanismos, justamente porque se ajusta à necessidade evolucionária do organismo - ou seja, percepções familiares e previsíveis.

Aí a porca torce o rabo: os três citados criam justamente uma estética baseada na negação ou não cumprimento dessas expectativas. O Huron fica numa tremenda saia justa para evitar a conclusão inevitável: essa música não apenas tem uma intenção estética esquisita (ser diferente), mas produz uma reação fisológica negativa. Ou seja, não é apenas ruim; faz mal.

Nenhum comentário:

Postar um comentário